

Porque ontem fui mais longe e vi e li um trabalho que está nomeadamente no You Tube sobre o último Kubrick, 1999. A seguir vi o Polanski de 1999, A Nona Porta, que por sinal foi rodado em Sintra, partes, e com afinidades em ritual, tipo Missa Negra. E estava-se no ano do eclipse de Agosto que aparentemente figura nas profecias de Nostradamus. Era o Milénio a despontar na treva e que em Portugal deu nome de banco, o que ilustra bem a perícia numérica necessária para dar conta das voltas do calendário em que se enfilam dias a dias adiante adiando, adiando.
Vale a pena proceder à decifração do Eyes Wide Shut porque o filme foi feito a contar com os videos, DVD, as internets. É material para analisar, decompor e comparar. E chega-se ao ritual, impressionante, mas onde tudo é carnavalesco, síncrese de elementos díspares, centrado num tantrismo cripto-religioso. Aos olhos do personagem principal que faz a sua passagem no local por estar desorientado, após um choque que o abalou no Ego instalado, clandestino, mascarado mas rapidamente desmascarado, é uma percepção do real de tipo onírico aquela em que vive e que o filme passa em segunda mão ao espectador.
No filme de Polanski referem-se tais rituais como passatempos de ricos e poderosos para dar pretexto à satisfação de apetites sexuais desviantes. E enquanto no primeiro filme as alusões a "Aquele Senhor", como os antigos diriam, ou seja o vicentino demo, só são claramente percebidas desmontando o filme, no segundo fala-se do Devil, há uma personagem, uma velha senhora francesa coleccionadora de livros de receitas mágicas-negras, que diz ter estado com ele quando tinha 15 anos. Morre no fogo, como ela própria referiu que assim sucederia no passado, em tempos de inquisições várias...E esta cena da morte é a mais saliente no Polanski.
O Demo, aliás, presta-se em português vernáculo a equívocos que devem preocupar os democratas. Demo-cracia é uma palavra arriscada e para que passe é preciso proceder a uma lavagem geral de esquemas linguístico-mentais, no qual têm um papel os meios orais de comunicação social. Falar mal e depressa, caricaturas sonoras, em publicidade ou em números cómicos, misturadas de som, de línguas e tudo vertido em décibéis de spots e fungagás e com esclarecimentos de vozes altamente credíveis ou sexualmente lisonjeadoras, entrecortadas de gritos de golo, GOLO, para que o orgasmo mental do telespectador aturdido ou do automobilista em stress se habitue a "pensar" pelo que emprenha pelo ouvido. Mas o filme desta situação tipicamente portuguesa ainda não foi feito, nem se vê quem o faça. Cilindrar a língua para que a Demo-cracia passe no goto até com algum prestígio, é obra. Agora qual o grimório ou receita usada nesta tarefa notável, ainda não consta que se saiba em que prateleiras está. nem se é cá a livraria ou lá. Também não interessa: a globalização aí está.
E por isso me fico pelos ingleses, que seguem uma tradição que já vem do Shakespeare, e seu tempo, passa pelo Swift, pelo Carroll da Alice das maravilhas e do Espelho (que era também pastor e matemático e fotógrafo. E fotógrafo, na época dele, era como hoje dispor de um satélite de alta resolução para tirar para cima e para baixo, a seu belprazer) e pelo Crowley. O tal que veio cá ter com o Pessoa em 1929 ou 30 e que deu uma controvérsia recente a propósito de algum espólio que ficou em Portugal. Isto quanto ao Kubrick que desde o Dr. Strangelove a este Eyes Wide Shut deixou um legado. Numa geração em que se salienta nessa linha o J.G. Ballard (Crash), o Peter Greenway (cinema), o Denis Potter (TV e rádio).
Quanto ao sincrónico com este, o Polanski, é um filme que carrega demasiadamente uma mensagem, reforçada pela figura de Emanuelle Seigner. Mensagem também da circunstância da época, mas que só aparentemente é obra do estilo Polanski, como em Frantic ou outros anteriores, desde mesmo os tempos heróicos da Polónia. E há então um desígnio de esperança que se comunica.
No Kubrick surge uma máscara nas cenas finais sob a almofada dele no quarto do casal, onde a mulher ocupa a sua parte da cama. E fica por se saber que faz ali e como lá foi parar a máscara. Obviamente um ponto em aberto e que será a mensagem patente ao espectador. O filme precisa que lhe tirem a máscara. E na operação o espectador, tornado decifrador, que máscara porá.
Vou incluir uma foto, que será de um encontro de xadrez Pessoa-Crowley em Lisboa. Será não será? À direita - já descobri como é que se põem fotos junto às msg - é uma fotografia autêntica. isto é, não uma montagem, como a outra poderá ser, de Pessoa no Martinho. Afinal ainda não sei tão bem: à direita em cima, à esquerda e mais abaixo...
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