
É uma maleita cada vez mais corrente, na era dos marginalizados e sem-abrigo que vai de par e se abre de par em par com a afluente globalização, nomeadamente quando lhe dá a "crise". É doença que consiste no abandalhamento pessoal crescente, que reduz a pessoa afectada à condição de um Diógenes, sem templo de Cibele, Grécia Clássica ou Filosofia.
E Diógenes, o S. João Baptista dos cínicos e estóicos, aparentemente queria ensinar o essencial, tropeçando continuamente no ensino complicado, que forçosamente tinha que combater. E fez de si exemplo, Vivia numa tulha, saía pela cidade em pleno dia com uma laterna, diz-se que com o intuito de encontrar um homem a sério. Comia cebolas, os ratos eram o seu harém, e satisfazia em público apetites carnais porque os apetites da tripa ou barriga de misérias eram mais custosos de satisfazer.
E aqui entra o mito, que agora se diz ser "urbano", o anedotário. Diógenes, como Bocage e outros é um habitante privilegiado dessa esfera, e na Filosofia não tem paralelo. É tema de escultura e pintura desde a antiguidade, agora até tem nome de maleita, ombreando com outros gregos saídos directamente do Mito para a lista dos distúrbios psíquicos, como Édipo, Electra, Cassandra.
Fez obra escrita que foi inspiração para outros, mas de que nada resta directamente. Empenhava-se em diminuir a sua dependência de fosse o que fosse: deitou fora a malga, ao reparar que um miúdo bebia fazendo concha com as mãos. Areemessou a colher, porque se podia perfeitamente comer lentilhas usando apenas buchas de pão, gostava de apanhar sol, talvez se alimentasse de luz, como os meninos do brejo da cruz da canção do Chico Buarque.
"O homem complicou o que eram os dons simples dos deuses", "Sou um cidadão de todo o Cosmos", e Cosmos em grego queria dizer o Mundo organizado natural, pouco mais ou menos. Diz o mito urbano que foi o primeiro a dizer uma tal coisa, que deu parafrases conhecidas como aquela do Kennedy, a dizer que era de...Berlim, quando era do clã.
O Mito Urbano agora dominante inclui o Tarot, que sonda os futuros. E o Tarot lá tem uma figura de idade, ataviado em balandrau, a levantar uma cadeia, a fazer lembrar a tal busca de Diógenes pela cidade. Noutra imagem, essa de filme sobre livro e coisas do diabo, aparece uma figura semelhante, diante de uma porta fechada e com a cadeia pousada. Candeia que surge no quadro de Waterhouse, à esquerda. E Giovanni Castiglione, pintor do sec. XVII, afirmou ser a reencarnação de Diógenes. Mas é na Bolha Informe do Mito Urbano que Diógenes está encarniçadamente implantado, tendo por ilustração viva sem-abrigo, alcoólicos e mais vencidos da vida sem literatura nem escola.
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