
Podem tomar os vossos lugares, ordeiramente, pelo chão do resto do verão afora.
Agora, já todos, todos confortavelmente instalados, eu vou para cima da árvore, mas não muito, para não ter uma vertigem e desabar. Ouvem bem, aí junto ao rio da minha aldeia, também?
Vamos admitir que todos sabem o que é falar, embora claro se admita que cada um tenha a sua forma de entender de acordo com a voz, mais que não fosse. Portanto, este aqui "falar" é específico, na medida em que se trata do escrever, que se faz em silêncio, de pena ou caneta em punho, ou com a parte martelar dos dedos, geralmente o médio da esquerda e da direita apenas, se se trata de um teclado de computador. Portanto estamos longe de uma escrita ou de giz em ardósia, o de pedra contra pedra, a entalhar. Mas mais perto dos romanos que usavam superfícies de cera e estilete.
E pode-se perfeitamente também pensar que as gradações que cada um terá do falar depende da quantidade e da forma de escrita que pratica. E do ler, sem dúvida.
Aliás o falar teclando, é um martelar. Digamos que "martelar" é mais na máquina de escrever, porque aí cada dedo em si funciona como martelo, falange+falanginha o cabo, falangeta, a cabeça. Martelo sem orelhas. No teclado de computador é mais a técnica de empurrão, uma coisa que ainda não conheço quem tenha bem definido e não há comparação imediata. É um gesto novo e que pode dar para "falar".
Mas, acima de tudo, é o tal falar de outra coisa. Sem mudar de assunto, embora pareça que seja antes outra maneira de falar. É que sem falar de outra coisa nunca mais se chega aquele ponto onde a falar é que a gente se entende. A escrita sempre teve este condõ de ser uma fala menos susceptível de evitar alguns atritos que o falar vivo suscita. Então escreve-se, para depois falar, e às vezes dá resultado. Uma escrita que, ao contrário do lapidar "escrever sobre pedra", não faz lei.
Neste caso, assume-se que a ligeireza do que se escreve (até pelo modo pouco esforçado como se escreve) entra no limbo em que se está a falar por falar, a falar para dizer outra coisa, a falar até a ver se pega. E há quem se exalte, brade, injurie, agrida, magoe, condene, minta, espalhe rumores, entre no que diz-que-diz com o simples premir de uma tecla...de rato. É a fala clique, que tem semelhanças com o comutador da luz, mas que está sobre a secretária. Acho que é possível que pelo falar clicando ter efeitos de imensa repercussão no mundo. Refiro-me a locais como bolsas ou controles de trânsitos e tráfegos.
Curiosamente, estes cliques leves em locais chave, saem fora do falar, que será por exemplo uma clicada num anúncio para ver o que dá. Os cliques leves em locais chave são comandos, que desencadeiam séries de consequências. É possível reverter a ordem, nalguns casos. Mas um clique nessas situações abre imediatamente um leque de acções assustador. É como soltar um grito num velório.
Para concluir: ao dizer "falar de outra coisa", espera-se que mudemos de assunto. Deixa-se, contudo, um rasto subtil, com tendência para passar a lastro no mar electrónico dos ecrãs: é que se há falar de outra coisa, há forçosamente falar desta coisa, assunto. Ou da coisa em que se estava a falar antes. É o perigo para quem diz que vai falar de outra coisa. Porque falar de outra coisa é coisa que acontece quando falar é conversar, e menos quando o falar é expor, que é uma espécie de palestra por escrito.
E disse "vou" e fui. Tenho teclado.
PS: A imagem era para ser aqui e ficou lá no alto
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